Diferença de até 15ºC separa Paraisópolis e Morumbi durante o verão em SP, diz estudo

Escrito em 29/12/2025


Prédio Penthouse visto da favela de Paraisópolis, na Zona Sul de SP Deslange Paiva/g1 Um estudo com imagens de satélite mostrou que a desigualdade social em São Paulo também se manifesta na temperatura. Durante o verão 2024/2025, a favela de Paraisópolis, na Zona Sul, registrou temperaturas de superfície de até 45 ºC, enquanto o Morumbi, bairro vizinho de alto padrão, ficou em torno de 30 ºC — uma diferença de até 15 ºC entre territórios separados por poucos quilômetros. O levantamento foi feito por pesquisadores do Centro de Estudos da Favela (Cefavela), da Universidade Federal do ABC (UFABC). Foram analisadas 19 imagens termais de um satélite de observação da Terra, referentes ao período entre dezembro de 2024 e fevereiro de 2025, quando a capital enfrentou sucessivas ondas de calor. As imagens medem a temperatura das superfícies, como telhados, ruas e o solo, que costuma ser mais alta do que a temperatura do ar registrada por estações meteorológicas. Mesmo assim, os pesquisadores Rohit Juneja, Flávia Feitosa e Victor Nascimento, que conduziram o estudo, alertam que valores acima de 40 ºC já representam risco grave à saúde, sobretudo para idosos, crianças e pessoas com doenças cardiovasculares e respiratórias. Moradores de favelas de SP driblam dificuldades para enfrentar o calor e se refrescar Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o calor extremo aumenta o risco de desidratação, insolação e agravamento de enfermidades crônicas. O que acontece com o corpo quando você sente muito calor? Entenda os cuidados com a hipertermia Pelo segundo dia seguido, SP bate recorde de calor para o mês de dezembro, com 36,2ºC SP tem aumento de 27% nos atendimentos por insolação e efeitos do calor em 2025 Em áreas de favela, onde as construções são mais densas, há pouca circulação de vento, escassez de árvores e grande presença de materiais que absorvem calor, como lajes e telhas metálicas, o impacto tende a ser maior. Além dos efeitos na saúde, o calor também pesa no orçamento das famílias, segundo o estudo. O uso constante de ventiladores e geladeiras sobrecarregadas eleva o consumo de energia elétrica em domicílios que, em muitos casos, já enfrentam dificuldades financeiras. De acordo com o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2022, São Paulo tem cerca de 11,5 milhões de habitantes, dos quais mais de 1,7 milhão vivem em 1.359 favelas. Embora essas áreas ocupem cerca de 4% do território da cidade, concentram mais de 15% da população. Nessas regiões, as temperaturas de superfície ultrapassam frequentemente os 40 ºC, como mostra um mapa interativo produzido pelo Cefavela. Confira o mapa neste link. Os resultados foram publicados inicialmente no jornal Nexo. Jovem se refresca do forte calor tomando ducha improvisada com mangueira na comunidade de Jerusalém, no Capão Redondo, Zona Sul de São Paulo Fábio Tito/g1 Calor de 47ºC O contraste observado entre Paraisópolis e Morumbi não é um caso isolado. Em Heliópolis, outra das favelas mais populosas da capital, as temperaturas de superfície passaram de 44 ºC nos dias mais quentes do verão. Já no Capão Redondo, também na Zona Sul, estão quatro das dez favelas mais quentes da cidade, com registros próximos ou superiores a 47 ºC, como a Jardim Capelinha/Nuno Rolando, Basílio Teles e Parque Santo Antônio. Naquele verão, de 2024 e 2025, a maior temperatura registrada em uma estação meteorológica aconteceu em fevereiro deste ano, com 34ºC. O verão 2025/2026, porém, já superou essa marca. A capital bateu o recorde de calor para o mês de dezembro no domingo (28), com 37,2ºC. Antes, as duas maiores marcas da história para último mês do ano ocorreram no dia do Natal e na sexta (26). Por outro lado, segundo o estudo, comunidades localizadas próximas a represas ou áreas verdes apresentaram temperaturas significativamente mais baixas. O Jardim Apurá, próximo da represa Billings, registrou 23,7 ºC, enquanto o Alto da Riviera B/Jardim Guanguará, na região da represa de Guarapiranga, marcou 23,6 ºC. Planejamento urbano Para os pesquisadores, os dados reforçam que o calor não é apenas um fenômeno climático, mas também resultado das escolhas de planejamento urbano. Segundo o estudo, soluções baseadas na natureza — como corredores verdes, parques, árvores, jardins de chuva, telhados verdes e hortas comunitárias — podem funcionar como um “ar-condicionado natural” das cidades, ajudando a reduzir as temperaturas e aumentar a resiliência urbana diante das mudanças climáticas. Para os autores, incluir o calor como um critério de inadequação habitacional é fundamental para enfrentar a desigualdade nas grandes cidades. Crianças se divertem em piscina durante dia de calor intenso na favela da Vila Prudente, Zona Leste de São Paulo Fábio Tito/g1